João Sousa despede-se com um legado sem igual: «Nunca pensei em fazer história»

Por Pedro Gonçalo Pinto - Fevereiro 27, 2024
João Sousa of Portugal plays against Giulio Zeppieri of Italy during the 1st round of the Millennium Estoril Open tournament at CTE- Clube de Ténis do Estoril.

Com um percurso sem paralelo possível na história do ténis português, João Sousa anunciou que vai colocar um ponto final na carreira no Millennium Estoril Open. Com muita imprensa presente, o vimaranense de 34 anos respondeu a uma série de perguntas sobre temas diferentes e mostrou-se em paz com a decisão tomada.

O QUE DIRIA AO JOÃO DO INÍCIO 

O João pequeno era muito inconsciente e nunca imaginaria que poderia algum dia alcançar aquilo que alcançou. O meu conselho era que acreditasse nele como fez, que nunca desistisse dos sonhos que sempre teve e que acreditasse em quem teve ao redor para atingir as metas que atingiu. Sempre disso isso, mas a verdade é que quando se trabalha e se tabalha bem, as coisas acontecerem. A minha capacidade de trabalho é a minha maior virtude e diria para trabalhar e acreditar nos meus sonhos.

SENTE QUE FEZ HISTÓRIA?

Nunca pensei em fazer história. A história veio por acréscimo à minha ambição de jogar ténis, de alcançar grandes feitos, isso sim. Nunca pensando na história. Aqueles que me conhecem sabem que ligo muito pouco aos recordes. Acho que a experiência e todos os momentos inesquecíveis que passei são parte do caminho e todo esse caminho fiz com plena consciência de que dei o meu melhor sempre. Tudo o que alcancei é um feito histórico, mas estou feliz pelo facto de ter dado sempre tudo e por deixar sempre tudo em campo. Ver os meus resultados emociona-me porque foram momentos que vivi muito intensamente.

MOMENTO MAIS MARCANTE

A minha conquista do Millennium Estoril Open foi o momento mais marcante da minha vida, da minha carreira. Foram emoções muito fortes. Deu para ver um bocadinho nesse vídeo e esta última edição vai ser ainda mais chorosa de certeza e muito emocionante. Acho que esse momento fica muito marcado.

IMPACTO NO TÉNIS PORTUGUÊS

Fico feliz por perceber que existem pessoas que desfrutaram comigo, que servi de alguma maneira como inspiração para elas também poderem perseguir o seu sonho. Muitos dos que aqui falaram tiveram o mesmo sonho de serem profissionais de ténis, este desporto magnifício e muito duro. Sinto um orgulho enorme por perceber que para muitos fui uma inspiração e por ter contribuído para que o ténis em Portugal fosse um desporto melhor e diferenciado de muitos outros. Fico contente por ver que os mais jovens acreditam em algo que antes nem se pensava. Antigamente era notícia quando alguém vencia um Challenger e hoje em dia quase nem se fala.

DEDICADO AO HOTEL DA FAMÍLIA

Tenho um carinho muito especial a esse projeto familiar em Guimarães. Vou tentar dinamizar mais, tentar que venham visitar esse cantinho especial não só meu, mas também da cidade. Tenho muitas coisas em mente e acredito que agora é tempo para pensar um bocadinho no meu futuro, dedicar tempo às pessoas que estiveram ao meu lado e a quem não dediquei tanto tempo antes.

PALAVRA QUE O DEFINE

A palavra seria conquista. As pessoas chamam-me conquistador não só por ser de Guimarães, mas por ter conquistado muita coisa e pelo espírito de trabalho, de resiliência que tenho e sempre tive.

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QUANDO PERCEBEU QUE ERA PARA TERMINAR

Não houve um momento em concreto. Simplesmente percebi que fisicamente já não consigo fazer o que fazia e o meu corpo não me permite jogar da maneira que jogava. A minha ambição é jogar sempre ao mais alto nível e não podendo nem sempre jogar ao mais alto nível, não faz sentido em termos mentais continuar a fazer um esforço e desgaste mental nesse sentido. Foi uma decisão muito meditada e profunda com as pessoas que sempre estiveram ao meu lado. Muitas pessoas gostariam que continuasse a jogar e que acham que poderia continuar a dar alegrias… Possivelmente sim, mas o meu corpo tem mostrado muitos sinais de cansaço extremo e a minha mente também. Por isso tomei esta difícil decisão.

ONDE FECHA A CARREIRA

Representar Portugal e ser jogador de Taça Davis é o maior orgulho que tive no ténis. Era um desejo enorme estar no grupo Mundial. Infelizmente tivemos uma eliminatória muito difícil na Finlândia e o meu desejo era estar no grupo Mundial, mas o MEO é o cenário ideal para me retirar enquanto tenista profissional. Foi o palco de maiores emoções que tive na minha vida. Acredito que faz muito sentido, também pelos meus patrocinadores, pela envolvência no torneio, por ser em Portugal, com o meu público.

PARTILHAR ERA COM O BIG THREE

Todos eles têm particularidades e algumas semelhanças dentro do mundo do ténis. Pude partilhar o campo com todos eles, também com o Andy, que é uma referência enorme no ténis mundial. Tivesse privilégio de poder estar com eles no campo, de poder privar em muitos momentos, nomeadamente com o Rafa. Acredito que tudo passa. As pessoas vão recordar-se daquilo que eu fui, do que eles foram, mas sinto um orgulho enorme no que fiz, sei que dei tudo o que tinha, estou de consciência tranquila.

O QUE SE SEGUE

Não existe nenhuma ambição a não ser estar envolvido no mundo do ténis. O ténis deu-me praticamente tudo o que sou e tenho hoje. Acredito que vou estar sempre ligado ao ténis, independentemente do papel que tiver. Vou fazer isso com muita paixão. Hoje em dia é difícil as pessoas fazerem o que realmente gostam e eu tive esse privilégio. De alguma maneira vou estar ligado ao ténis, seja dentro do campo ou fora dele.

O QUE VEM AÍ NO ESTORIL OPEN

Tenho-me tentado manter fisicamente ativo, tenho treinado quase todos os dias e o objetivo é estar na máxima força para o MEO. Vou ao Estoril Open para vencer encontros, não vou lá só despedir-me. O momento é muito emotivo para mim, mas tenho-me preparado da melhor maneira. Não sei se faz sentido jogar algum torneio antes, mas a ambição é vencer sempre todos os encontros que jogo. É nesse sentido que tenho trabalhado. Tenho um mês e uma semana para me preparar para esse evento e vou dar tudo por tudo como sempre fiz.

O ténis entrou na minha vida no momento em que comecei a jogar aos 7 anos. E a ligação com o jornalismo chegou no momento em que, ainda no primeiro ano de faculdade, me juntei ao Bola Amarela. O caminho seguiu com quase nove anos no Jornal Record, com o qual continuo a colaborar mesmo depois de sair no início de 2022, num percurso que teve um Mundial de futebol e vários Europeus. Um ano antes, deu-se o regresso ao Bola Amarela, sendo que sou comentador - de ténis, claro está - na Sport TV desde 2016. Jornalismo e ténis. Sempre juntos. Email: pedropinto@bolamarela.pt