Bellucci abre o coração: «Ser tenista é ser julgado o tempo inteiro»

Por Bola Amarela - Maio 13, 2020
bellucci

Thomaz Bellucci, o melhor jogador brasileiro de singulares desde Gustavo Kuerten, tem uma das histórias mais interessantes de todos os tenistas do circuito, pelos altos e baixos que a sua carreira profissional (e a sua vida) foi oferecendo. Ganhou títulos ATP (4), foi top 25 mundial, alcançou vitórias sobre muitos dos melhores tenistas do Mundo e até chegou a aplicar um 6-0 a Novak Djokovic na terra batida de Roma. Mas depois vieram as lesões, o doping e muitos problemas que ele contou em exclusivo ao novo projeto ‘A Voz do Ténis’ e que vale mesmo a pena ler na íntegra aqui.

A perceção dos outros. “Sempre me preocupei muito com o que os outros iam pensar de mim. Talvez até demais. Ser tenista é ser julgado o tempo inteiro. Dependemos do resultado e temos de lidar bastante com o aspeto mental. É um desporto que maximiza tudo na nossa vida. Toda a nossa vida entra dentro do court. E muitas vezes acabamos a perder pelo que se passa fora de campo. O mais fácil é jogar ténis. É chegar lá e treinar. O mais difícil é lidar com tudo o resto.”

Tímido desde criança. “Eu sempre fui um garoto muito introvertido. Sempre tive muita dificuldade em fazer novas amizades. A escola era um lugar onde eu não gostava de estar. Tinha poucos amigos. O positivo do colégio são os relacionamentos sociais que criamos, as amizades que levamos para o resto da vida. Eu tinha mais facilidade em fazer amigos no meio do ténis”.

Pessoas têm imagem errada. “Quando era mais jovem, não conseguia expressar-me. Eu comunicava mal com os fãs, com as pessoas e isso passou uma imagem minha ruim, distorcida, como pessoa mesmo, nem tanto como jogador. Talvez isso tenha causado um mal-entendido. Possivelmente, é por isso eu tenho uma imagem que não é a que eu gostaria de ter. Quando és uma figura pública, acabas a ser julgado. Julgado o tempo inteiro. Às vezes é bom disparar aquele ‘foda-se’, sabe? Tentar pensar “eu vou fazer meu máximo e as pessoas vão falar mal ou bem independentemente do que eu faça”. “

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Incentivo dos pais para ser tenista. “No meu caso, sempre fui incentivado a virar tenista. Eu também queria muito a aceitação do meu pai, o orgulho dele como pai a ver o filho ser tenista. Em nenhum momento ele disse “se não correr bem, vai ter que parar de jogar”. Talvez as dúvidas que foram crescendo foram mais de mim próprio. Por ter de abdicar de muita coisa para ser profissional e sentir que estava a perder minha infância e adolescência. A minha vida passou a ser o ténis”.

O doping. “A pausa por doping foi o momento mais desafiador da minha carreira. Além do período de perder o ritmo, de voltar do zero, tinha a questão emocional, de como as pessoas iam receber a notícia. Para mim isso pesava muito mais do que perder pontos no ranking, prémios… Não me preocupava em cair no ranking, mas sim com aquilo que estava a acontecer comigo na época.”

As dificuldades de competir no Brasil. “Quando você joga em casa, você quer ser apoiado independentemente do resultado. Há sempre a motivação extra de você jogar com o público do seu lado, a empurrar. Aquele dia mudou um pouco a minha relação com a ‘torcida’. A partir dessa altura foi sempre mais difícil. Todas as vezes que eu entrava em court no Brasil depois daquele jogo, [em São Paulo 2013, quando saiu e acabou vaiado], aquela cena vinha à minha cabeça… “será que se eu não jogar bem, o público vai vaiar-me de novo?”

Não pensa na reforma. “Eu ainda não me vejo a reformar-me por agora. Já tenho 32 anos, mais de 15 temporadas como tenista profissional. Não vejo os meus resultados mais recentes atrelados à minha idade. Fisicamente, eu sinto-me bem. Talvez daqui a três, quatro anos, eu comece a amadurecer essa ideia, comece a pensar no fim desta jornada. Lógico que tudo depende dos próximos resultados. Se eu estiver a jogar torneios menores, a chance de me despedir mais cedo é maior. Um retorno ao top 100 aumentaria as chances de seguir. Estou a trabalhar duro para isso. Não está fácil. Nunca foi mesmo.”

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