Os obsessivos rituais que fizeram Borg vencer cinco vezes Wimbledon

Por Susana Costa - Outubro 13, 2017

Num dia normal, seria sobre os intensos últimos 20 minutos do filme que estaríamos aqui a ‘spoilar’, mas esta sexta-feira – treze – pede uma perspectiva mais oculta e enigmática do filme de ténis do momento, que leva para o grande ecrã a épica final de Wimbledon de 1980, entre o bad boy John McEnroe e o imperturbável Bjorn Borg.

A cena é a seguinte: McEnroe, a jovem estrela em ascensão, e o ‘bom vivant’ Vitas Gerulaitis partilham um daqueles sofás vermelhos típicos de boate dos anos setenta/oitenta, numa comum saída à noite em plena semana de Wimbledon, quando Borg, a estrela do ténis que procurava vencer o Grand Slam inglês pela quinta vez, se tornou no tema de conversa.

McEnroe, então número dois mundial e grande candidato a quebrar a hegemonia do sueco na catedral do ténis, questionava a calma imperturbável do seu rival. Gerulaitis explicava que ‘Ice Borg’ era, na verdade, um vulcão a fervilhar por dentro, prestes a explodir a qualquer momento. O que o fazia conter-se eram os meticulosos e obsessivos rituais que mantinha.

“Toda a gente quer ser o Bjorn. Todos querem alguma coisa dele, o que faz dele o homem mais solitário do planeta”.

O que se segue é uma ritmada e esclarecedora descrição (narrada pela boca do carismático Gerulaitis, finalista de Roland Garros nesse ano, em que só perdeu com Borg), das impressionantes superstições (convenientemente empoladas para efeitos cinematográficos) que Borg levou à risca durante os quinze dias de torneio, ano após ano:

– Ficava no mesmo hotel e no mesmo quarto;

– À noite, programava o ar condicionado do quarto do hotel para os 12ºC, mantendo a pulsação nos cerca de 50 batimentos cardíacos por minuto;

– Espalhava as raquetes no quarto do hotel e pisava-as, descalço, para sentir a tensão das cordas e escolher as ideiais para o dia seguinte (a tensão era tanta que acordava durante a noite com o som de algumas das cordas a partir);

– Só permitia que os pais viessem assistir ao torneio ano sim, ano não;

– Todo o equipamento – camisolas, calções, meias, punhos – era meticulosamente dobrado e arrumado no saco pela sua namorada, a jogadora romena Mariana Simionescu, com quem casou nesse ano;

– O carro em que era transportado tinha de ser sempre o mesmo (há uma cena no filme em que o sueco percebe, ao tocar no banco, que não se trata do carro dos anos anteriores e pede ao seu treinador para falar com a organização do torneio);

– Não fazia a barba durante o torneio;

– Usava sempre a mesma camisola às riscas da Fila, que se viria a tornar num ícone;

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Descobriu o que era isto das raquetes apenas na adolescência, mas a química foi tal que a paixão se mantém assolapada até hoje. Pelo meio ficou uma licenciatura em Jornalismo e um Secundário dignamente enriquecido com caderno cujas capas ostentavam recortes de jornais do Lleyton Hewitt. Entretanto, ganhou (algum) juízo, um inexplicável fascínio por esquerdas paralelas a duas mãos e um lugar no Bola Amarela. A escrever por aqui desde dezembro de 2013.